Em novembro passado, tendo as igrejas e o Casario do Pelourinho como pano de fundo, uma bolsa terminou sendo uma das protagonistas do Afro Fashion Day, evento que reúne mais de duas dezenas de marcas de estilistas pretos da Bahia num grande desfile, e que hoje é o grande acontecimento fashion de Salvador, reunindo nomes como Adriana Meira, Meninos Rei e Sillas Filgueiras.

As tais bolsas que geraram um zum-zum-zum danado eram assinadas por Dih Morais, autodidata que até então ganhava a vida produzindo ecobags com frases e símbolos reverenciando o candomblé. Feitas de crochê, o que chamava atenção era uma inusitada cabaça na base, in natura mesmo – construídas na base por uma cabaça.

Dih percorreu um longo caminho até chegar à passarela do Afro Fashion Day. Nascido há 38 anos na comunidade quilombola do Barro Preto, em Jequié, no sudoeste da Bahia – entre a caatinga e Zona da Mata –, filho de mãe solo que ganhava a vida trabalhando como doméstica, o estilista não teve a chance de ir além do ensino médio.

Aos 21 anos, em 2006, deixou Jequié e foi tentar a sorte em Recife, seguindo os passos de um namorado. Tentou estudar marketing, mas não conseguia pagar a faculdade particular, e para se sustentar passou a animar festas e eventos na pele de Ita Morais, draq queen que inventou e que habitou sua pele até 2016, quando foi morar em La Coruña, na Espanha, seguindo um outro namorado.

Por lá, Diego – seu nome de batismo – fez cursos de ilustração de moda e vitrinismo e começou a confeccionar ecobags para se sustentar, a maioria pintada à mão. De volta ao Brasil, continuou explorando este filão, só que agora usando referências ao candomblé, marcando um momento em que se ligou mais intensamente à religião.

A ideia de criar bolsas de cabaça e crochê veio com o convite para participar do Afro Fashion Day. Como o tema da edição 2022 era Capoeira, pensou em criar um acessório em torno da planta trepadeira muito usada na caatinga para armazenar água, mas também famosa por fazer parte do berimbau e de outros instrumentos usados em afoxés e rodas de capoeira.

“Na minha infância a cabaça também servia de cuia, e no candomblé tem seu próprio papel, muito ligada a Exu. Foi uma espécie de chamado, criar a bolsa a partir dela”, conta. Definida a base, o crochê da estrutura deu a bolsa uma forma de saco, artesanal, prática e fashion ao mesmo tempo.

No fim de maio, foi a vez das bolsas de suas bolsas cruzarem a passarela do São Paulo Fashion Week, no desfile da Santa Resistência. A dobradinha das duas etiquetas – e dos dois criativos, Dih Morais e Mônica Sampaiomade in Bahia, reforçam a potência regional que respondem à pergunta feira por Carmem Miranda na canção “O Que É Que A Bahiana Tem?”.

As bolsas de cabaça de Dih Morais estão à venda na Casa NORDESTESSE, em São Paulo.
Alameda Lorena, 1601, Jardins.