Quando você compra um brinco da Azulerde, você não leva para casa apenas um brinco. Você leva uma causa, uma peça afro-contemporânea, uma arte política, um objeto reciclado. Moda, feminismo, luta antirracista, sustentabilidade e arte compõem o DNA da marca pernambucana criada pela bióloga Karla Batista, de 25 anos.

Seus brincos e colares assimétricos, de formas orgânicas e cores vibrantes, feitos de acrílico com detalhes digae prata, já apareceram em publicações como Vogue e Bazaar e já foram usados por nomes potentes na esfera da influência digital como Silvia Braz. Mas Karla fica feliz mesmo quando percebe que quem compra uma peça sua entende de fato que está carregando mais que um brinco.

A pernambucana se descobriu designer – e artista – no meio de uma crise. Criada em Igarassu, vila de pescadores a uma hora de Recife, ela havia acabado de se formar em Ciências Biológicas e estava prestes a começar um mestrado, com bolsa e tudo, quando teve um burnout. “Eu sabia que não queria seguir na trilha de ciências biológicas, mas não conseguia me ver, como jovem mulher negra, no papel de artista. Para mim artista era uma pessoa branca, que teve todos os privilégios possíveis, e que pintava telas, de forma tradicional. Aos poucos fui me conscientizando de que aquele espaço também me cabia.”

O esforço para ser admitida no mestrado, e a intuição de que não era aquilo que queria para sua vida, levaram ao burnout. A “cura”, ainda bem, estava mais perto do que Karla imaginava. “Meu namorado na época estudava Arquitetura, e uma professora dele nos levou para conhecer uma oficina de prototipagem no Porto Digital de Recife. Quando percebi as inúmeras possibilidades de se construir objetos a partir de ideias abstratas, tive um estalo que era aquilo que queria para minha vida”, lembra.

Some a isso a preocupação com o uso exagerado dos derivados de plástico, natural para quem passou a faculdade lidando com os alarmantes dados de contaminação de rios e oceanos, e o resultado é a espinha dorsal da Azulerde.

A marca começou a ser desenhada em 2017, mas as primeiras peças só passaram a ser comercializadas com regularidade em 2019. “Minha ideia era trabalhar apenas com resíduos sólidos reciclados, mas tive muita dificuldade em encontrar fornecedores dispostos a vender seus materiais descartados, acredita? Alguns ficavam literalmente incomodados por ter alguém atrás do lixo deles. Até hoje, por exemplo, não consegui encontrar arquitetos ou marceneiros que me fornecessem descartes de fórmica! Não consigo entender.”

Atualmente Karla trabalha com acrílico reutilizado que obtém em uma empresa que faz placas de sinalização e com laminados descartados por uma oficina na periferia de Recife. Mas não são suficientes para sua produção, mesmo que pequena, e ela termina tendo de comprar novos. “Como me formei em Ciências Biológicas, sei bem o drama das estatísticas ecológicas, por isso sempre quis que minha produção fosse o menos poluente possível. Só que nunca consegui ser totalmente circular, isso é uma problemática até hoje.”

Uma outra dificuldade enfrentada por Karla foi construir uma clientela que não consumisse acessórios apenas pela estética. “Meu processo criativo sempre traz uma provocação. Mais que criar acessórios autênticos, queria que minhas coleções também refletissem essas provocações.” Acontece que nem todas as clientes estavam interessadas em entender o processo de Karla. As reclamações sobre prazo de produção, por exemplo, a deixam frustrada. Mas como explicar para uma consumidora acostumada ao fast fashion o tempo necessário para uma peça feita à mão? “A coisa mais difícil é explicar por que não trabalho com pronta-entrega. Passei a usar o Instagram para mostrar as etapas e complexidades da produção e criei a hashtag #nãoésóumbrinco.” Deu certo!

Vencidos esses desafios, a Azulerde está hoje quase do jeito que Karla planejou, com três pilares fundamentais. “As peças que crio transitam no corpo como um acessório, mas fora dele são também objetos de arte.” O segundo pilar é garantir que a produção seja baseada na economia circular, o mais sustentável possível. O terceiro é fazer com que suas criações reflitam as inquietudes contemporâneas. “Para além de objetos de arte autênticos e vívidos, como uma artista preta eu também quero promover conhecimentos e reflexões sobre arte, moda, design, sustentabilidade. Quero que minha cliente saiba a importância daquilo que carrega consigo. Essa é a Azulerde para mim.”

As peças da Azulerde estão à venda na multimarcas Dona Santa, em Recife, e no www.azulerde.com.br.

@Azulerde