Qual a sua relação com seus vizinhos e com o bairro onde você mora? Quem propõe essa reflexão é o paraibano Marcos Felipe – ou Cacimba –, artista visual que retrata a rotina de pequenas cidades do interior com todos os seus clichês: crianças na rua, galinhas nos quintais, café sendo passado para receber visita e boa prosa entre compadres e comadres. “Isso pra mim é riqueza”, afirma.

Natural de Cacimba de Dentro, município que fica a mais de 170km de João Pessoa, Marcos mudou-se para o Rio de Janeiro aos 2 anos. “Meu pai já estava trabalhando na capital. Fomos depois, eu, meus 5 irmãos e minha mãe. Uma história que ela sempre conta é que eu fiz aniversário na estrada, na altura da Bahia. Acho que veio daí minha inquietude.”

Apesar de não ter memórias vívidas dos poucos anos no interior, Marcos diz que carrega lembranças das histórias que a avó e a mãe contavam. “Parece que todo mundo é seu parente; as portas de casa estão sempre abertas para conversar, tomar um café… Gosto de resgatar no meu trabalho esse senso de comunidade.”

Essas imagens forjadas a partir de fragmentos de memória foram se encaixando quando regressou à Paraíba e à cidade natal. “Apesar de ter crescido no Rio, sempre me vi diferente. Em Cacimba eu gostava de conversar com as pessoas, ouvir histórias, e aprender mais sobre esse cuidado com o outro, com a natureza, com o tempo. Acho incrível como tem gente que olha só pro céu e sabe que amanhã vai chover.”

Sua relação com a arte começou ainda na infância. “Não me lembro de não desenhar.” Fez cursos de caricatura, pintura com guache, aquarela e tinta acrílica. Foi com a caricatura que aprendeu a ter um olhar mais crítico da arte, a “colocar o dedo na ferida”. Chegou a cursar um ano de Publicidade, mas abandonou a faculdade porque o trabalho como tatuador falou mais alto.

Quando voltou a focar nas artes visuais, decidiu usar o alterego Cacimba para assinar os trabalhos com pintura e separar do lado tatuador. O nome escolhido faz referência ao nome da cidade onde nasceu, mas não só. Cacimba também é como se chama um poço ou cisterna, e Marcos diz que se sente um “escavador de memórias” quando pinta. E que belas memórias!