A galeria baiana Paulo Darzé é conhecida por projetar no cenário nacional artistas que já tinham carreira sólida, mas careciam de reconhecimento do establishment. Foi assim com Rubem Valentim anos atrás, e quem visitou a última SP-Arte já entendeu quem é a “nova” aposta.

José Antônio Cunha – ou simplesmente J.Cunha – pode até ser “novato” entre alguns círculos das artes plásticas, mas o baiano de 76 anos é figura conhecidíssima em Salvador, nem tanto pelas telas que pinta, mas por ter definido a identidade visual do bloco afro Ilê Ayê.

Mas esse “desconhecimento” está com os dias contados: é que no último dia 4 foi inaugurada na Pinacoteca de São Paulo a exposição “Corpo Tropical”, maior retrospectiva de sua carreira, com mais de 300 obras, entre pinturas, desenhos, cartazes, estampas, objetos e documentos.

Nascido em Ponta de Humaitá, ao lado do Bonfim, J.Cunha é filho de uma doméstica sertaneja, de Canudos, e de pai operário, descendente de ciganos da Armênia. A falta de recursos não permitiu que sonhasse com faculdade – menos ainda de arte. “Naquela época era tudo sobre curso técnico. Tive de obedecer o que me deram.”

Estudou tornearia mecânica e desenho técnico no Senai, destacou-se no segundo curso e, por causa disso, foi parar no curso de Belas Artes da UFBA. “Fui aceito de cara e lá minha cabeça mudou. Me dediquei aos estudos porque pintar eu ‘já sabia’. Aproveitei o livre acesso à biblioteca e aos professores.”

Finalizada a graduação, migrou para a parte mais “prática” da arte para sobreviver. A cenografia foi o seu ganha pão. Definiu a identidade visual do Ilê (amarelo, branco, vermelho e preto), uma parceria que foi de 1979 até 2005. O brilhante uso das cores é sua assinatura. “O gosto pelos tons vivos tem relação com minha descendência de bantos africanos e de índios kiriris.”

Suas telas também têm um pé na pop arte, mas trazem muito das pinturas indígenas, com seus padrões geométricos. “Fiquei conhecido na cidade por causa do Ilê Aiyê. Mas como artista mesmo, nunca tinha recurso, espaço. Museus e galerias só queriam saber de arte europeia.”

Que bom que não é mais assim. Quem já visitou a nova mostra na Pinacoteca?